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10/06/2014

BREVE HISTÓRICO E IMPORTÂNCIA DAS DANÇAS DE DEMI-CARÁCTER NOS BALLETS DE REPERTÓRIO



As danças de demi-carácter ou danças características são recursos expressivos do ballet que representam um,a das formas da arte coreográfica. Presentes nos grandes ballets de repertório, apresentam metodologia própria de ensino, com terminologia técnica específica (nomenclatura) e  estrutura de aula fundamentadas nos princípios da dança clássica acadêmica. Para tanto, percorreram um longo caminho.


Entre os séculos XVI e começo do século XIX, quando serviam de definição a uma dança-símbolo, popularizada nos intermezzos em representações de personagens da Comédia dell’ arte, se limitavam à reprodução de  atitudes comportamentais, maneiras, gestos e movimentos específicos presentes em determinadas esferas sócio-culturais. Hoje, quando dizemos danças de carácter, nos referimos às danças populares de forma geral, e dessa forma, estamos presos ao conceito utilizado naquela época, quando a função cênica de tais danças era basicamente a de contextualizar na obra  a época histórica na qual se desenrolava a ação, apresentar classes sociais e etnias dos personagens.

Desde o começo do século XIX, o interesse pelo estudo do folclore e seu emprego nas artes teatrais vai ganhando força na Europa e principalmente, na Rússia. No romantismo, nos espetáculos de Taglioni e Jules Perrot, a nova expressão - “dança de demi-carácter-  definia o recurso que “servia de contraposição do mundo das Sílphides ao mundo real, subordinado às leis ditadas pela música orquestrada ou sinfônica  e à linha estilística do espetáculo”.

No final do século XIX, os estudos sobre os princípios de  execução dos pas das danças populares, e possibilidades estilísticas de seu uso no espetáculo (algumas vezes nas pontas),  enriqueciam e marcavam a essência das montagens de Ivanov e Petipá. No Lago dos Cisnes, Bela Adormecida, Paquita, Dom Quixote, La Bayadère e em inúmeras outras montagens, são as danças de demi-carácter que nos situam na ação. O ballet Raymunda merece destaque. Sua montagem é considerada pelos críticos a melhor combinação e unidade estilística (plástica e musical) entre os elementos de demi-carácter e dança clássica acadêmica.

Como todo baile na corte tinha início com uma polonaise e fechamento com mazurca, e considerando que os convidados chegavam de terra distantes, principalmente da Hungria, Rússia, Espanha, Oriente, é indispensável na formação do bailarino, o conhecimento dos princípios de execução técnica dessas danças e  compreensão das características mais marcantes nesses povos. Um húngaro não dança como um espanhol, que não dança como um polonês. Portanto, Raymunda, não dança como Paquita, que não dança como Swanilda. O trabalho de tronco, braços, intenções e diversas nuances expressivas são próprias da história de cada  personagem.

A criação dos exercícios de dança de carácter cênico (mais um sinônimo para dança de demi-carácter) permitiu que nas montagens dos ballets, os coreógrafos pudessem explorar melhor  os temas musicais. Como exemplo, temos A “Rapsódia Húngara” de Lizt.

Da mesma forma que na dança clássica uma grande referência é Vagânova, na dança de carácter,  temos Andrey Lopukhov – solista no Ballet Kirov entre os anos de 1916 e 1945 (não confundir com Fiodor), que nos anos 30 em São Petersburgo, deu início à criação de um sistema de ensino. Entre seus alunos, estão Grigarovitch.

Danças húngaras, polonesas, russas, orientais (bloco), ciganas e espanholas são obrigatórias na formação de qualquer artista de ballet na Rússia e e seu aprendizado é paralelo ao da dança clássica. Não se dança repertório sem esses conhecimentos. Como nos dá prazer assistir a uma czarda bem dançada em Coppélia, não é mesmo?



No começo do século XX, com a criação de inúmeros ballets de carácter, Fokin inicia uma nova etapa na História da Dança. “O ballet antigo via a dança de carácter como elemento episódico nos divertisments. O novo ballet considera a dança de carácter como sendo o fundamento da expressão plástica, ao lado com a dança clássica”. Como a expressão artística está sempre subordinada ao espaço cênico, a estilização das danças populares, não só é permitida como necessária, desde que não comprometa a fidelidade coreográfica - tarefa difícil. Nesse sentido, Fokin foi um grande mestre. “Mais de 20 países  foram representados em seus ballets. O folclore, era sua “grande inspiração coreográfica”. Príncipe Ígor, Danças Polovetsianas, Scheerazade e dezenas de outros ballets, representam uma fonte de pesquisa de grande riqueza.

Para finalizar, é importante ilustrar os diversos usos da expressão dança de carácter, abordados neste artigo. Nesse sentido, cabe Petruschka, espetáculo onde  temos o carácter, enquanto dança-símbolo (Baba-Iagá), enquanto dança popular (mujiques, por exemplo) e demi-carácter (russas e ciganas).


Denise Figueiredo
Bailarina, professora e coreógrafa, formada pela Academia de belas Artes de São Petersburgo - Rússia
Chefe depto: Boris Bregvádze

Consultas:
“Contra Corrente”. (Protiv Tetchenia)  Mikhail Fokin. Ed. Iskustvo. Moscow-Leningrado.1945.
“Ballet Russo”. Enciclopédia. (Ruskii Balet. Entsiklopediia). Ed. Soglacie. Moscow. 1997.

www.conexaodanca.art.br
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